Cansado de “comer merda”, volante Mascherano é o coração da Argentina

BELO HORIZONTE – "Estou cansado de comer merda".
Foi isso o que Javier Mascherano disse para o restante do elenco antes de a Argentina entrar em campo contra a Bélgica. Questionado sobre a frase, reclamou. Disse que deveria ficar restrita aos jogadores. Mas não a desmentiu.
O volante foge do papel de líder, mas é a ele que os outros jogadores se voltam quando a coisa em campo aperta. Só deixou de ser capitão porque o técnico Alejandro Sabella cismou de que a braçadeira deveria ser de Messi e fez com que Mascherano convencesse o camisa 10 a aceitá-la.
A frase representa as eliminações argentinas nas últimas Copas do Mundo. Ao lado de Messi e Maxi Rodríguez, ele é o único a ter participado da eliminação nas quartas de final em 2006 e 2010. Ambas contra a Alemanha. Eram 24 anos sem chegar à semifinal. Por isso, Mascherano disse estar cansado de comer merda.
"Amo esta profissão e me encanta o que faço. Há 24 anos a Argentina não faz esse jogo [a semifinal]. O que fizemos contra a Bélgica apenas aumenta a expectativa das pessoas e o destino vai se encarregar de nos colocar onde merecemos", opina.
Poucos atletas tem a mesma relação do volante com a camisa alviceleste. Ele foi chamado como sparring no Mundial de 2002. Foi um dos garotos convocados por Marcelo Bielsa para ajudar nos treinos. Viu de camarote a equipe cair ainda na primeira fase. No ano seguinte, em amistoso contra o Uruguai, fez sua primeira partida pela seleção principal antes mesmo de jogar profissionalmente pelo River Plate.
Mascherano tem vários dos títulos que todo jogador deseja conquistar. Campeão nacional na Argentina (River Plate), Brasil (Corinthians) e Espanha (Barcelona), conquistou a Liga dos Campeões da Europe a o Mundial de Clubes. Mas não tem nenhuma conquista pela seleção principal, apesar de ser dono de duas medalhas de ouro nos Jogos Olímpicos (quando a maioria do elenco é Sub-23).
"A Argentina tem uma dívida. Já passou da hora de estarmos entre os quatro melhores do mundo", observou. "Agora que chegamos, queremos mais."
Dentro de campo, é ele que segura as broncas de uma defesa suspeita e que tem pouca proteção do meio-campo. Contra o Irã, quase foi à loucura com os passes errados dos colegas. Di María e Higuaín já disseram publicamente a importância que Mascherano tem para o time.
Antes do Mundial, Alejandro Sabella disse que Mascherano e Fernando Gago eram o "coração da Argentina". Gago tem jogado tão mal que acabou no banco de reservas, substituído por Lucas Biglia.
"Não vou falar de mim porque aqui colocamos o ´nós´ na frente do ´eu’", é a mensagem que tenta passar porque a constatação é óbvia. Apesar de entrar sempre como favorita, a Argentina não é campeã mundial desde 1986. Não vence nem a Copa América desde 1993. "Somos astros nos nossos clubes, mas na seleção não ganhamos nada. É a realidade. Nós não ganhamos nada com a seleção."
Com 30 anos, ele sabe que a possibilidade desta ser sua última Copa, é grande. Sempre reconhecido pela seriedade, Mascherano está ainda mais compenetrado neste ano. É como se fosse sua última chance. De levantar a taça de campeão do mundo e de impedir o Brasil de fazê-lo. Tanto que antes da viagem, ele já lançava uma ideia de "vitória ou morte" que cala fundo à alma argentina.
"Se tiver de vendermos a vida, morreremos como mártires".