Emoção na chegada dos caixões de 51 dos mortos
CHAPECÓ, SC – A vontade era receber o time quase como campeão. Em vez disso, os moradores de Chapecó (SC) viram os jogadores do clube amado entrarem no estádio em caixões.
A cidade abraçou a trajetória da Chapecoense, que ascendeu em cinco anos da série D para a série A e, de repente, se viu no centro do mundo por causa da maior tragédia do esporte brasileiro.
A queda do avião fretado do time, na Colômbia, que disputaria a primeira partida da final da Copa Sul-Americana, deixou 71 mortos na madrugada de terça-feira (29), incluindo 19 jogadores, 24 membros da delegação e 20 jornalistas. Sobreviveram dois tripulantes, três jogadores e um jornalista.
Sob forte chuva depois de dias seguidos de sol, o município do oeste catarinense recebeu na manhã deste sábado os caixões de 51 dos mortos, com milhares de moradores se despedindo das vítimas no estádio, nas ruas e no aeroporto. Torcedores estavam aos prantos – concretizando a perda que parou Chapecó a semana inteira.
Após passagem por Manaus, os corpos das vítimas chegaram à cidade catarinense às 9h25 em dois aviões da FAB (Força Aérea Brasileira).
Muito emocionados, familiares dos jogadores interromperam encontro com o presidente da República, Michel Temer (PMDB), para acompanhar a retirada dos caixões.
"O presidente cumprimentou os familiares e já começaram a chegar os aviões com os corpos. Não houve solenidade, não houve nada", disse Daniela de Marco, filha de Edir de Marco, ex-presidente do clube morto no acidente.
Uma equipe médica ficou no aeroporto – pelo menos seis pessoas passaram mal.
Em seguida, houve um cortejo em direção à Arena Condá. O velório no estádio de Chapecó fez parecer que a trama de filme chegou ao fim.
Com medo de ser vaiado, Temer havia decidido inicialmente receber os familiares só em evento reservado no aeroporto. Após críticas de parentes de vítimas, que falaram em "desrespeito" e "falta de dignidade", ele recuou e decidiu que iria ao estádio.
O clube esperava que 100 mil pessoas acompanhariam o velório, mas a chuva afastou parte dos torcedores, que ficaram dias seguidos indo ao espaço prestar homenagens, fazendo dali um memorial com flores e centenas de cartazes.
O estádio, com capacidade para 19 mil, não chegou a lotar -do lado de fora, os quatro telões instalados não se mostraram necessários.
Os torcedores repetiram a espontaneidade dos dias anteriores e cantaram gritos de guerra como se os jogadores estivessem em campo, chamando cada um pelo nome.
"É nosso último adeus", lamentava a professora Mara Ecco, 56. "Eram nossos amigos queridos, nossos vizinhos."
Torcedores entrevistados pela reportagem sempre choravam ao falar da tragédia. Eduardo Barros, 15, colocou as mãos no rosto: "Não consigo acreditar que não vou vê-los nunca mais." Jogador da sub-15 do time, estava na arquibancada, sem proteção, encharcado, lágrimas misturadas à chuva.
Ilaídes Padilha, mãe do goleiro Danilo, herói da classificação do time na competição, entrou em campo extremamente aplaudida. Torcedores gritaram o nome do jogador.
Na sexta, emocionou o público ao consolar o jornalista da SporTV Guido Nunes, no meio de uma entrevista: "Como vocês da imprensa estão se sentindo depois de perder tantos amigos queridos lá?"
Na Colômbia, o time e a torcida do Atlético Nacional, que enfrentaria a Chapecoense na quarta (30), fizeram uma homenagem às vítimas que repercutiu pelo mundo.
O presidente Temer decidiu que iria ao velório um dia após a assessoria da Presidência da República dizer que o peemedebista "jamais cogitou" participar da cerimônia e que sua presença exigiria um esquema de segurança especial, criando problemas para familiares e amigos.
Temer temia vaias. Mas, segundo a assessoria, a decisão de ficar só no aeroporto tinha o objetivo de não "explorar a dor de ninguém". Neste sábado, mudou de discurso.
"Não poderia dizer ontem [que irei] porque, se eu dissesse, a segurança iria colocar pórticos na entrada do estádio e revistar as pessoas que entram. Então, só comuniquei que eu vou agora para facilitar a vida", disse Temer.
Ao lado do embaixador colombiano no Brasil, o presidente disse ainda que a forte chuva em Chapecó "deve ser São Pedro chorando pela morte dos jogadores."