Estado deve reassumir gestão do Hospital Regional do Noroeste, em Paranavaí

CURITIBA – O Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR) determinou à Secretaria da Saúde do Estado do Paraná (Sesa) que apresente, no prazo de 90 dias, um plano de ação para o encerramento da cessão do Hospital Regional do Noroeste à Santa Casa de Paranavaí. Esse prazo passará a contar a partir do trânsito em julgado do processo, no qual cabe recurso.
A Santa Casa ainda deverá comprovar o recolhimento de contribuições previdenciárias desde março de 2014 e o pagamento ou parcelamento de débitos previdenciários pelas empresas Baena & Siriani Ltda., contratada para prestar serviço de plantão no pronto-socorro; e Abraão & Lanza Ltda., contratada para prestar serviço de plantão na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) de adultos, sob pena de instauração de Tomada de Contas Extraordinária.
A decisão foi tomada no julgamento de Relatório da Auditoria que analisou as transferências voluntárias realizadas entre a Sesa e a Santa Casa de Paranavaí, decorrentes da celebração dos termos de convênio números 41/2011, 69/2011, 186/2012, 23/2013, 54/2013, 65/2013 e 94/2013, referentes aos exercícios financeiros de 2011, 2012 e 2013, no valor total R$ 11.382.978,21.
Os convênios tinham por objeto a aquisição de equipamentos para a ampliação da UTI neonatal, além da estruturação do serviço de oftalmologia e de um arco cirúrgico (equipamento de raio-x utilizado em cirurgias), ambos destinados à Santa Casa de Paranavaí. Também foram realizados repasses de recursos para a conclusão do Hospital Regional do Noroeste, a construção de rampas entre os setores do hospital e a manutenção da instituição.
No relatório, a equipe de auditoria apontou as seguintes irregularidades: terceirização do serviço público de saúde a entidade privada, sem que tenha ocorrido a simples complementariedade; cessão indevida de unidade hospitalar, com a utilização de equipamentos públicos para finalidade particular; e falta de retenção de contribuições previdenciárias de prestador de serviço de mão de obra.
LEGISLAÇÃO E DOUTRINA – A participação da iniciativa privada na execução do orçamento público, especialmente na área da saúde, vêm sendo tema recorrente na doutrina administrativista.
O estabelecimento de vínculos jurídicos entre o Estado e entidades filantrópicas, com a intenção de fomentar o desenvolvimento de ações de interesse público, é instituto histórico que teve muitas vezes sua utilização desvirtuada, para que se realize terceirização de serviços públicos essenciais, em flagrante tentativa de burla às regras do Direito Público.
O Acórdão nº 680/06 do Pleno do TCE-PR estabeleceu que “não pode ser objeto de vínculos externos a cessão total de unidades de assistência à saúde e hospitalares (capacidade instalada), as quais devem ser objeto de gestão própria por vínculos internos”.
O parágrafo 1º do artigo 199 da Constituição Federal assegura a participação da iniciativa privada, de forma complementar, mediante contrato de direito público ou convênio, no Sistema Único de Saúde (SUS).
A Lei nº 8080/90, conhecida como Lei Orgânica da Saúde, dispõe, em capítulo próprio, sobre essa participação complementar; e o artigo 24 dessa lei estipula que o SUS somente poderá recorrer aos serviços ofertados pela iniciativa privada quando as suas próprias disponibilidades forem insuficientes para garantir a cobertura assistencial à população de uma determinada área.
O constituinte previu duas formas para participação do particular no SUS: por meio da contratação de serviços e por meio de convênio, para o atendimento à demanda social selecionada pela Constituição.
O Supremo Tribunal Federal (STF) fixou as premissas em relação à celebração do contrato de gestão para a formalização de convênio, como a qualificação da entidade como organização social (OS) e os requisitos que legitimam essa execução indireta dos serviços públicos. Simples dificuldades ordinárias não autorizam a transferência da gestão.
É necessário demonstrar que haverá ganho de eficiência, o que permite ao poder público direcionar a atuação do particular, em uma relação de fomento, com a imposição de deveres (metas) e a competência fiscalizatória dos órgãos de controle externo.
O STF destaca, ainda, que os atores públicos e privados devem participar e colaborar entre sim, sem que haja mera delegação de serviços, com a obrigatoriedade de que ocorra o processo de qualificação da entidade e o procedimento público de chamamento para a celebração dos ajustes.
Em outras palavras, não se permite a mera cessão do bem público, pois ainda que haja a cessão de bens e até mesmo servidores à OS, o Estado permanece atuante na administração e na fiscalização do contrato. Portanto, a constitucionalidade do modelo não garante a celebração de todo e qualquer contrato de gestão, de forma desregrada e desmotivada, sendo plenamente cabível o controle de mérito sobre o ato administrativo que optar pela execução indireta dos serviços públicos.
EXPLICA DECISÃO – O relator do processo, conselheiro Nestor Baptista, afirmou que é impossível conceber que a transferência do Hospital Regional do Noroeste à gestão da iniciativa privada, por meio de simples instrumento de convênio, obedeça ao comando da complementariedade inerente ao SUS.
Ele destacou que é preciso considerar, também, que o Estado do Paraná já possui legislação que estabelece seu Programa de Organizações Sociais (Lei Complementar Estadual nº 140/2011).