A (suposta) amiga oculta

Ela chegou um dia sem avisar e como quem conhecia tudo.
A princípio estranhei aquela companhia, que, uma vez acomodada, passou a fazer parte da minha vida.
Eu vinha de um longo período de desgaste físico e emocional e ela parecia compreender exatamente o que eu sentia.
Quando chegou começou a falar comigo com calma, devagarinho, trazendo lembranças e falas que há muito eu havia esquecido.
Comecei a me ver de forma diferente com os fatos que ela me apresentava. Conforme o tempo passava, as memórias se tornaram mais intensas assim como as falas que ela repetia.
Havia momentos, em que relembrávamos cenas inteiras com os diálogos, as cores e todas as emoções que desfilavam pela minha mente.
Ela então se instalou. Viva e cheia de energia, dizia, dia após dia, que estava ali para ficar, que era necessária e que tudo o que eu havia passado e estava sentindo era compreensível. Nos ecos dos meus cacos emocionais, acreditei.
E assim as semanas corriam, eu cada vez mais envolvida pelos argumentos dela e cada vez mais fraca diante do que ela me mostrava.
Os dias se tornaram densos e escuros. Tentei reagir, mas ela me dominava e vencia.
O que antes era tristeza agora tornava as horas insuportáveis.
Meus sonhos foram consumidos, meus planos dissecados e excluídos. 
Ela sabia tudo. 
Ela tinha todas as respostas.
Ela me dominava.
Passei a buscar saídas. Desesperadamente quis tirá-la da minha vida, mas seus dedos longos e perfurantes estavam cravados na minha alma.
Ela crescia à medida que eu definhava.
Nas noites insones que passaram a me fazer companhia, tentei desesperadamente encontrar explicação para o que eu me tornara.
Fraqueza, temor, insegurança e prostração agora me definiam e ela, cada vez mais forte e vigorosa, cuspia sem piedade palavras amargas no meu rosto.
Um dia pensei em fugir. De casa, do mundo, da vida. Um minuto de silêncio para coordenar as ideias e sentir algum alívio.
Ela, atenta a tudo que se passava comigo, sorriu em regozijo. “Sim, fuja” ela me dizia toda animada. “Há tantas formas, tantos jeitos. Só assim eu irei embora”.
E no turbilhão de emoções que me assolavam passei a acreditar que só havia uma forma de me livra dela: esquecer a vida.
Tentei muitas vezes explicar o que eu sentia. Falei para tantos que tivessem paciência, que era ela quem me atormentava e me tirava o juízo. Mas poucos a viam, raros a compreendiam e a maioria nem sabia da sua existência, mesmo porque, no dia a dia eu a mantinha contida e apenas nos meus momentos de solidão lutava com ela.
Para todos, ela era invisível.
Para mim, era a morte. Fria e terrível provocando o choro e extraindo minha esperança.
A depressão afeta mais de 330 milhões de pessoas no mundo. 
Em torno de 6% dos brasileiros sofrem com esta doença que representa quase 2% de todas as mortes no mundo cujo principal desfecho é o suicídio. 
A depressão não escolhe faixa etária, mas os idosos e jovens a partir dos quinze anos são mais afetados.
 
Ao contrário das doenças físicas que mostram claramente o estrago que fazem, a depressão muitas vezes é confundida com má vontade, humor ruim, falta de educação, desatenção e tantas outras características equivocadas que são usadas para justificar o comportamento de quem está deprimido.
Tristeza profunda, amargura, desencanto, desesperança, baixa autoestima, culpa… Eis o dia a dia de quem sofre desta doença.
Além de toda a dor que uma pessoa depressiva vive, é comum ainda a impaciência, o preconceito e até o isolamento daqueles que a cercam, agravando o quadro.
Há momentos com tanta dor, sem explicação, que realmente se pensa em morrer, nem que seja só um pouquinho, para acabar com o que se sente e ter um pouco de paz.
Respeito e ter informações sobre a doença talvez sejam as primeiras providências para ajudar quem sofre e precisa de cuidados.
O descaso, muitas vezes, é o responsável por consequências terríveis e irreversíveis.
Portanto, sendo doença deve ser tratada como tal. Jamais se deve descartar o acompanhamento médico em qualquer tipo de depressão, mesmo que seja a mais leve delas.
No mais, atenção, afeto, compreensão e carinho nunca são demais. Até para quem não sofre de depressão.

Edeni Mendes da Rocha (Teka)