As leis fracas e os paladinos
Dirceu Cardoso Gonçalves*
Ao mesmo tempo em que o governo faz a festa dos parlamentares do baixo clero, dando-lhe as benesses nunca antes conseguidas, para evitar o afastamento do presidente, tramitam pela Câmara dos Deputados projetos que ainda vão dar muito que falar.
No novo Código de Processo Penal, os parlamentares ensaiam mudar a delação premiada, fixar limite de tempo para a prisão preventiva e criar limites para a condução coercitiva. Num primeiro momento, essas providências parecem legislação em causa própria, pois atingirão os pilares da Operação Lava Jato, onde dezenas de congressistas estão envolvidos e outros ainda poderão ser alcançados.
Outra proposta é eliminar a prisão dos condenados em segunda instância, além da emenda Lula, que pretende proibir a prisão de candidatos.
Não há dúvida de que a nossa legislação penal precisa ser modernizada. O Código Penal data de 1940 e o de Processo Penal de 1941, atualizado em 2008. Durante todos esses anos, a esperteza dos criminosos e o profissionalismo dos seus defensores encontraram imensas brechas que levam à nefasta impunidade e são um incentivo à prática delituosa.
Essa legislação genérica deveria ter atualização em períodos pré-determinados. A cada quatro anos, por exemplo. Dessa forma, os parlamentares de todos os mandatos teriam a obrigação de realizar uma pequena reforma e não seriam expostos ao constrangimento de legislar em causa própria, como hoje se aponta. E, ainda, seriam fechadas as brechas que tanto têm potencializado as injustiças e o crime no país.
As leis – desde os códigos até as específicas – devem ser elaboradas de forma a sustentar o funcionamento da sociedade e dar garantias ao cidadão quanto aos seus direitos. Quando ficam muito velhas e desatualizadas, em vez disso, abrem a possibilidade de inovações que levam à radicalização.
Os institutos da delação, prisão preventiva, condução coercitiva, a entrada em domicílio e outras medidas hoje largamente praticadas, precisam de urgente regulamentação e padronização. Não para inibir o cumprimento da ação penal, mas para evitar os possíveis excessos.
O país precisa de um ordenamento legal forte e atualizado e não carece de paladinos que executem suas tarefas com pirotecnia ou glamour. Quando a lei é fraca, dúbia ou desatualizada, abre chance para a figura do herói efêmero, que pode proporcionar-lhe satisfação pessoal, mas em nada beneficia o país e a sociedade.
Mesmo indiciado, o cidadão tem seus direitos, que precisam ser respeitados. Não deve pagar pena maior do que a estabelecida em lei…
*Dirceu Cardoso Gonçalves – dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo)