“As vozes silenciaram em um minuto”, diz sobrevivente de incêndio em ônibus no Rio

RIO DE JANEIRO – Ainda tremendo, William Lemos, 35, relembrava como as chamas consumiram o coletivo da viação Mauá, após uma batida em um poste que causou a queda do transformador, na manhã de ontem. Nove corpos foram encontrados carbonizados dentro do veículo.
"Sabe quando você risca um fósforo? Foi assim. Em pouco tempo tudo estava em chamas. As vozes de dor e socorro silenciaram em menos de um minuto", disse Lemos, que trabalha como limpador de ônibus para a empresa dona do coletivo e foi um dos sobreviventes do acidente.
O veículo da linha 532, que faz o trajeto Niterói-Alcântara, em São Gonçalo, na região metropolitana do Rio, pegou fogo após colidir contra um poste, por volta das 5h30 da manhã. Inicialmente os bombeiros informaram que oito pessoas haviam morrido, mas outro corpo foi identificado no início da tarde, dentro do ônibus.
Outras oito pessoas foram internadas, incluindo uma mulher de 17 anos que não estava no coletivo, mas testemunhou o acidente e ficou em estado de choque.
O limpador de ônibus afirmou que estava sentado no último banco do coletivo, a caminho do trabalho, quando, em uma rua sem iluminação, o motorista desviou de um caminhão da Ampla, concessionária que administra a rede elétrica do município de São Gonçalo.
"Quando o ônibus fez uma curva brusca, olhei para ver o motivo e vi o caminhão. Logo em seguida, ele derrapou na lama e bateu no poste. O transformador de luz caiu na parte da frente e explodiu", disse Lemos.
Com faixas de ataduras nos dois braços, o limpador diz ter quebrado o vidro de uma janela com socos e chutes. Outras três pessoas conseguiram pular pelo mesmo caminho. Já um outro passageiro, que saiu por outra janela, fugiu das chamas, mas teria morrido eletrocutado.
"Ele quebrou a janela. Quando pulou, um fio elétrico que balançava rápido o acertou e ele morreu na hora. Minha roupa ainda estava com chamas. Rolei na lama para apagá-las. Ainda em estado de choque, sentei e filmei as chamas consumindo o ônibus. Era o que poderia ter como prova", disse Lemos.
Ainda de acordo com a vítima, os bombeiros demoraram cerca de 40 minutos para chegar ao local. Já a assessoria da corporação diz que entre ser chamada e chegar ao ônibus passaram-se oito minutos. A assessoria da Ampla afirmou apenas que está colaborando com as investigações.
INVESTIGAÇÃO – A Polícia Civil investiga as causas do acidente. A perícia já foi realizada no local e testemunhas estão sendo ouvidas. Até o momento, os relatos são conflitantes. O frentista Joel Guimarães, 46, que ajudou no socorro das vítimas, disse que o ônibus desviou de um outro veículo, que estava na contramão.
"Ele desviou desse outro carro e bateu no poste. Nisso, o transformador caiu na parte da frente do ônibus. Com outro colega, ajudei a socorrer três pessoas. Um homem gritava pedindo que salvasse a sua filha e mulher, mas elas ficaram no ônibus. Foi terrível", disse.
Na delegacia, pessoas procuravam por informações de parentes que costumavam pegar o ônibus e estavam desaparecidas.
A polícia irá dirigir familiares dos mortos ao ICCE (Instituto Criminalística Carlos Éboli), no qual será feito o recolhimento de DNA, já que os corpos das vítimas fatias estavam carbonizados, impossibilitando o reconhecimento.
Um dos parentes estava na delegacia, buscando por sua cunhada, mas não quis se identificar, nem nomeá-la. "Sabe quando você tem esperança e não quer acreditar? Se eu te falar o nome dela e sair no jornal esse pesadelo pode ser verdade", disse, chorando.
Entre as vítimas socorridas, três se encontram em estado grave, incluindo o motorista e o cobrador. Outras duas já receberam alta do hospital.