Cambota, o paranavaiense que fez dupla com Milionário, José Rico e Dalvan

O falecimento do cantor sertanejo de nome artístico José Rico, ocorrido no último dia 3 de março, que fazia dupla conhecida nacionalmente com Milionário, deixou chocados emocionalmente milhares de fãs pelo Brasil, mas especialmente os familiares e amigos de Terra Rica e de Paranavaí. Nesta cidade quem se emocionou especialmente foi o eletricista de profissão Laerte Antonio Ribeiro e também cantor sertanejo nos fins de semana sob o nome artístico Cambota. Foi ele que praticamente possibilitou a José Rico iniciar e se atirar no mercado fonográfico com a música sertaneja. Mas não foi só José Rico, não. Nas entrevistas à televisão, blogs e jornais por ocasião do falecimento do artista de voz inconfundível, o companheiro Milionário e outro cantor famoso, Dalvan, que fez dupla com o falecido Duduca, todos eles lembraram seus primeiros passos na vida artística e, além do empresário da dupla, contaram um pouco da origem das duplas pelas mãos do paranavaiense Cambota. Todos têm em comum, além do apoio e incentivo de Cambota, o fato de terem se elaborado e conhecimento entre si, até formarem as duplas, adquiridos em Paranavaí. A propósito, a vida de José Rico vai virar livro, cujos dados estão sendo coletados por empresário e amigos que estiveram na semana passada em Paranavaí para ouvir Cambota e amigos de Terra Rica.
Cambota esteve nesta semana em visita ao Diário do Noroeste para contar uma parte da convivência entre eles. Por ocasião do falecimento de José Rico, Cambota estava a trabalho como eletricista fora da cidade e não foi possível o contato.
Ele relembra emocionado o início da carreira de José Rico, Milionário e também de Dalvan.

O COMEÇO
Natural de São José de Belmonte-PE, José Alves dos Santos (José Rico) veio para o Paraná com a família no início da década de 60. A família ficou em Bela Vista do Paraíso, onde seu pai passou a trabalhar como barbeiro e ele veio para Terra Rica, para trabalhar na lavoura. Em 1966 conheceu o paranavaiense Cambota, que fazia apresentações com colegas pela região, inclusive como animador de comícios em campanhas eleitorais desde 1968, 1972, 1976, etc, e, como gostava de cantar, vinha a Paranavaí nos fins de semana para ensaiar juntos. Eles ensaiavam na sexta-feira para cantar no sábado e domingo em apresentações públicas e nos programas de rádio locais, animados por Carajá, Goiaba, Armando Trindade Fonseca, Romance, Genésio César e outros que passaram pelas Rádios Paranavaí e Rádio Cultura na época.
Laerte Antonio Ribeiro adotara o nome artístico de Cambota e passou a formar dupla com José Alves dos Santos (José Rico), com o nome artístico Cambaí. Faziam tanto sucesso nas apresentações em toda a região, que tentaram viabilizar a gravação de um disco, na época do vinil. Cambaí (José Rico) chegou a viajar para o Mato Grosso para conseguir ajuda financeira que obteve com João Pupato, fazendeiro e irmão do sogro dele. Nesse entremeio, na década de 60, eles fizeram amizade com outra dupla local, Branco e Neguito, este nome artístico de Romeu Januário de Matos, que depois formou dupla com José Rico, com o nome artístico Milionário.
Nessa época todos enfrentavam dificuldades até de subsistência. Não podiam deixar de trabalhar como eletricista – no caso de Cambota – ou como agricultores – no caso dos demais – pois a vida artística não tinha a valorização que tem hoje, e viver dela era apenas um sonho.

VIDA DIFÍCIL
Perseguindo o sonho, Branco e Neguito se aventuraram para São Paulo, onde tinham amizades que os podiam abrigar por algum tempo. Conseguiram gravar um disco e contratar alguns shows. Fizeram o mesmo em Londrina. Nesta cidade a saudade de casa apertou. Branco tinha esposa e filhos que moravam em cômodos vizinhos à família de Cambota, que já tinha os filhos Laude, Rose e Marcos, no mesmo terreno, em Paranavaí. O dinheiro ganho em apresentações artísticas mal dava para as despesas e, sentindo-se na pior, Branco apelou para a ajuda do amigo Cambota. Como também tinha família em Paranavaí, Cambota não podia se aventurar pelo País afora e então propôs uma parceria de Cambaí, em quem via grande potencial, com quem formava dupla, para Neguito. A princípio este resistiu: “Não dá certo. Eu sou primeira voz e ele também. Como vamos conciliar isso?”, argumentava. Cambota insistiu: “O Cambaí (José Alves dos Santos) é muito bom, tem potencial. Você deixa a primeira para ele e faz a segunda. Isso vai dar certo. Vocês vão arrebentar a boca do balão”, insistiu Cambota. Aí surgiu em 1968 a dupla Neguito e Cambaí, que passou a cantar pelo Paraná afora. A dupla largou-se pela estrada da vida e Cambaí (José Rico) nem pôde assistir o filho que tinha com Geralda em Paranavaí num momento vital. Cambota foi levar o corpo do menino Cristóvão para o avô enterrar em Bela Vista do Paraíso. Geralda pegou a outra filha do casal e foi embora para a casa dos pais em Mato Grosso, onde construiu outra família. Cambaí foi atrás, mas não reatou o casamento com ela. Ficou com a cunhada.  

MILIONÁRIO E JOSÉ RICO

Foi num show que a dupla Neguito e Cambaí fazia em Assis Chateaubriand que a história de José Alves dos Santos e Romeu Januário de Matos mudou. Um empresário das gravadoras Chantecler e Copacabana assistia ao show e se impressionou com a dupla, conta Cambota. Ao final, ele procurou os artistas e ofereceu a oportunidade de gravarem um disco. Logo depois foram para São Paulo para gravar e aceitaram a sugestão de mudar o nome, com um sentido mais comercial. Como tinha raízes em Terra Rica, Cambaí passou a ser conhecido como José Rico e o companheiro Neguito como Milionário.
Algumas das músicas gravadas e que possibilitaram o sucesso da dupla eram de autoria de Cambota, entre as quais “Martírio de Dor”, “Três pedidos de amor”, “Filho de Bela Vista”, “Belavistense”, “O Jardineiro”, ou em parcerias com José Rico, como “De longe também se ama” e outras.

DUDUCA E DALVAN
Cambota tinha conhecimento com quase todos os cantores sertanejos ou caipiras, como eram mais denominados até há alguns anos, de Paranavaí e região, e mantinha sempre contato com eles. Era como um guru de todos. Depois de Cambaí, Cambota acabou formando dupla com Rosselito, com quem animou muitos comícios políticos pela região, sem deixar a profissão de eletricista, como prestador de serviços na época para empresas como a Instaladora Cotel e a Noroeste Construções. Rosselito morava na Vila City em Paranavaí, onde foi criado, mas nasceu em Planaltina do Paraná em 9 de outubro de 1951.  
A dupla Cambota e Rosselito continuou na jornada da vida, cantando e fazendo amizades, entre as quais com Zé da Serra, Zezé di Camargo & Luciano, Piãozinho, Celso e muitos outros. Conheceu também o paulista pintor de paredes José Trindade, que desde 1975 praticava o hobby de fazer roteiros e trilhas sonoras para cinema. Num desses encontros, Trindade convidou Rosselito, o José Gomes de Almeida, para participar de um filme, “Pirâmide de amor” e depois de outro. Isso foi no ano de 1977, quando os dois atuaram juntos no filme “Entre o Céu e o Inferno de Camanducaia”.
Eles se tornaram amigos e, como não podia deixar de ser, nos intervalos das gravações pegavam os violões e cantavam para passar o tempo. E logo eles e os que os ouviam perceberam que as vozes se harmonizavam perfeitamente, surgindo daí a nova dupla, que teve o incentivo de Cambota e o apoio de Lourival Santos. José Trindade adotou o nome artístico de Duduca e Rosselito (José Gomes de Almeida) mudou para Dalvan.
Desde cedo Trindade demonstrou seu dom para a música, tendo sido vocalista de conjunto, baterista, guitarrista, além de dominar perfeitamente o violão, órgão, piano e acordeão. Dalvan era um virtuose instrumental. O resultado foi o sucesso que a dupla experimentou enquanto atuou e ainda é relembrado, na voz sola de Dalvan, até 17 de fevereiro de 1986. Nesse dia inesperadamente Duduca faleceu e deixou Dalvan só.

E CONTINUA…
Depois de projetar tantos artistas que se consagraram em todo o País, o paranavaiense Laerte Antonio Ribeiro continua trabalhando como eletricista e cantando nos fins de semana sob o nome artístico Cambota, em parceria com Cambaí, agora personificado por Laércio da Conceição. E vai levando pela estrada da vida seu coração de luto, pelo companheiro que se foi e pelo filho, policial militar recentemente assassinado por um transgressor da lei no Jardim São Jorge.