Em sessão tensa, deputados chamam ministro de “palhaço”

BRASÍLIA (FOLHAPRESS) – Após fala inicial do ministro Cid Gomes (Educação) na Câmara dos Deputados, congressistas criticaram a postura do titular da pasta e pediram a demissão do político.
Cid abandonou a convocação da Casa, ontem, após ouvir uma enxurrada de críticas dos deputados, numa tensa sessão no Plenário da Câmara. O argumento é de que o ministro não se desculpou de fato pela declaração de que a Câmara possui ampla maioria de achacadores.
"Isso reflete uma opinião pessoal, fora da postura da conduta do ministério. Se isso não pode na visão de alguns, [para mim] é perfeitamente separado", afirmou o ministro. "Perdoe se isso ofende alguém, se alguém traz para si a carapuça, se alguém se enxerga nessa posição", ironizou.
As declarações geraram reação inflamada do plenário. O presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) afirmou que o titular da Educação será alvo de processos.
PAPEL DE PALHAÇO – "Eu poderia dizer que esse cidadão está fazendo papel de palhaço. Eu poderia dizer que era melhor esse cidadão pendurar uma melancia no pescoço pra poder aqui aparecer, mas o que eu digo aqui não é isso. Eu peço a Vossa Excelência que encerre a sessão pra que esse cidadão possa sair daqui e nunca mais voltar e nós possamos tomar as medidas judiciais cabíveis", disse o deputado Sérgio Zveinter (PSD-RJ).
Em seguida, Cid abandonou o plenário.
Ao deixar o plenário da Câmara em meio à confusão, Cid afirmou que foi agredido pelos deputados. "Eu comecei a minha vida no parlamento. Eu respeito o parlamento mas infelizmente eu fui convidado e agredido. Estou liberado para me retirar".
Após a primeira fala do ministro, o líder do PMDB, principal aliado do governo na Casa, foi o primeiro a reagir à postura de Gomes. Leonardo Picciani (RJ) cobrou "mais sinceridade" do ministro e disse ser "muito fácil" fazer críticas sem apontar nomes.
"Tanto faz se essas críticas foram feitas de forma pública ou de forma privada, porque devemos ser os mesmos a portas fechadas ou nas ruas. Não há duas regras: homem público não pode ter um comportamento em público e outro a portas fechadas", disse ele.
O líder do PSOL, Chico Alencar (RJ), ainda indicou certa ingenuidade de Cid. "Faltou até a sagacidade política. No mundo de hoje, ainda mais para quem é agente público, nada é privado. Mas ainda assim não achei que ali estava o fim da República", ponderou.
Ele completou ainda que não vestiu "nenhuma carapuça", como sugerido por Cid. "Por isso, sinceramente, achamos um desastre aquela declaração."
O líder do DEM na Casa, Mendonça Filho (PE), argumentou que as declarações do ministro criaram um cenário "desmoralizante" para o governo.
"Criou-se uma situação tão desmoralizante para a base do governo que é literalmente inacreditável. Não precisamos de oposição nesta casa, este governo produz uma crise por dia".
O líder do Pros na Casa, Domingos Neto (CE), foi um dos poucos a tentar amenizar as desavenças. Ele argumentou que o ministro pediu desculpas e demonstrou "respeito pelo Congresso". Para ele, da mesma legenda de Cid, discutir a permanência ou não de Cid indicava "interesses obscenos" dos críticos.
SORRISO IRÔNICO – Líder do PSC na Casa, André Moura (CE) discursou sobre uma série de episódios polêmicos em que Cid esteve envolvido. Entre eles, a construção de um aquário em Fortaleza (CE) e o uso de recursos do Estado para ida à Europa com familiares.
"Tenho certeza que com esse sorriso irônico e cínico, vossa excelência não está fazendo nada mais do que vir e dizer que não tem moral para continuar ministro da Educação".
O tucano Nilson Leitão (MT) alegou que a briga, na verdade, era entre o ministro e a própria base do governo – Cid apontou "oportunismo" daqueles que assumem cargos no Executivo, mas votam contra o governo no Congresso.
"Essa briga é de ministro com a base, mas o Parlamento precisa se levantar. O senhor acusou deputados desta Casa de ladrão. É o que está escrito no dicionário [sobre o conceito de achacadores]. Então, quando se acusa de ladrão é necessário chegar até o final, que de fato o senhor nomine essas pessoas".
O congressista Cabo Sabino (PR-CE) foi ainda mais crítico: "Vossa excelência deveria ter dado seu pronunciamento sentado aí embaixo, porque nesta tribuna é para subir quem o povo representa, e não o empregadinho da mamãe".

Cid diz estar “feliz” com saída do Ministério
Ao sair do Palácio do Planalto, onde pediu demissão do cargo de ministro da Educação, Cid Gomes (Pros-CE) defendeu a presidente Dilma Rousseff, voltou a criticar o Congresso e disse estar "feliz" com sua saída.
"A meu juízo ela tem as qualidades que são necessárias", afirmou, após um rápido encontro com a presidente, em que pessoalmente a comunicou de sua decisão.
"Tem muito discurso de oposição, muita gente que fala em corrupção. Isso parece ser uma coisa intrínseca ao governo, mas o que Dilma está fazendo é exatamente limpar o governo de corrupção que aconteceu no passado. Isso que ela está fazendo. É por isso que a gente vive uma crise hoje. Quem demitiu esse [ex-diretor da Petrobras] Paulo Roberto [Costa, um dos delatores na Operação Lava Jato], esse [também ex-diretor da Petrobras e preso pela Lava Jato] Renato Duque, foi ela. Há muito tempo".
Segundo ele, a atual crise ligada à Lava Jato "é anterior a ela [Dilma]". "Ela, ao contrário, como é séria, está limpando e não está permitindo isso".
Para Cid, é justamente a atitude contra a corrupção que fragilizou a relação da presidente com o Congresso. "E é isso que fragiliza sua relação com boa parte dos partidos, que querem isso [corrupção]".
O ex-ministro lembrou da lista de parlamentares suspeitos de relação com o esquema de corrupção na estatal que o STF (Supremo Tribunal Federal) investiga. "Você viu do PP, quantos deputados recebiam mensalidade de um diretor na Petrobras? Isso era a base do poder. E ela está mudando isso. E isso, óbvio, cria desconforto".
Cid criticou novamente o Congresso. "A população está vivendo um momento difícil, a toda hora é bombardeada pela crônica da corrupção, mas o conceito que a população brasileira faz do Parlamento… eu considero o Parlamento fundamental para a democracia, o que é lamentável é a sua composição e a forma de o parlamento se relacionar com o poder", disse.
"Virou o antipoder. Ou tomam parte do poder ou apostam no quanto pior, melhor, para assumirem o poder e muitas vezes fazerem as mesmas coisas que se está se fazendo, ou pior".
Sobre o pedido de demissão, o ex-ministro afirmou que ele foi feito em caráter irrevogável, e que não deu espaço para Dilma dizer que não o aceitaria.
Segundo ele, suas declarações desta terça no Congresso, em que confirmou declaração anterior sobre existirem de 300 a 400 achacadores no Congresso, tornou sua situação insustentável.
"A minha declaração, e mais do que ela a forma como eu coloquei a minha posição na Câmara, óbvio que cria dificuldades para a base do governo. Pedi demissão em caráter irrevogável, agradecendo a ela. Eu não dei margem [para Dilma insistir ou dizer não]. Eu disse: "Presidente, lamento muito, agradeço, mas estou aqui entregando o cargo de ministro", afirmou.
"Falei com ela. Eu disse para ela que lamentava muito, que tinha muito prazer, que confiava nela, que acreditava nela, continuo acreditando, continuo confiando. Agora, a minha presença no ministério ficou numa situação de contraponto, de indisposição com a base que apoia o seu governo".
Ainda assim, Cid disse estar "feliz".
"Eu estou feliz. Lamento pela educação do Brasil. Lamento porque tem muito o que fazer, e eu estava muito entusiasmado. Eu tinha muito entusiasmo pelo ministério da Educação. Já tinha visitado seis Estados em dois meses e pouco. Iniciamos projetos que são importantes para melhorar a educação pública no Brasil".