“Nível da medicina em Paranavaí será elevado a novo patamar”, diz diretor clínico da Santa Casa

A residência médica, iniciada esta semana na Santa Casa de Paranavaí, nas especialidades de pediatria, oftalmologia, clínica médica e clínica cirúrgica, será um marco na medicina local.
“A medicina em Paranavaí será dividida entre antes e depois da residência médica que estamos começando na Santa Casa. Com a residência médica, o nível da medicina em Paranavaí será elevado a um novo patamar”, diz o diretor clínico da Santa Casa, Rubens Costa Monteiro Filho, que será o médico preceptor da residência em oftalmologia.
Michel Luiz Spigolon, diretor técnico, chefe da UTI da Santa Casa e médico preceptor da disciplina de Clínica Médica diz que a residência médica “é muito mais importante do que qualquer obra executada ou equipamento adquirido para a saúde. É uma mudança de conceito, na forma de ver a medicina, um aumento no comprometimento dos médicos”.
“A residência médica se não for a única é um dos principais mecanismos de melhorar o atendimento num curto espaço de tempo”, complementa o cirurgião geral Leônidas Fávero Neto, preceptor da especialidade de clínica cirúrgica.
A pediatra Daniela Frazzato, médica preceptora da residência de sua especialidade concorda com seus colegas: “a residência médica representa um crescimento para a Santa Casa, para os médicos e para a saúde em geral”. Explica que os residentes vão fazer atendimentos em ambulatórios, “sempre supervisionados”, ajudando na melhoria da saúde pública.
CREDENCIAMENTO – O processo de credenciamento da Santa Casa de Paranavaí pelo Ministério da Educação (MEC) começou no ano passado e durou 10 meses. Neste período foram avaliados toda a documentação do hospital, suas instalações físicas, equipamentos, corpo clínico e equipe de enfermagem.
“O MEC pediu alguns ajustes que foram providenciados, inclusive uma biblioteca virtual para que os residentes pudessem fazer suas pesquisas”, conta o coordenador administrativo da Santa Casa, Héracles Alencar Arrais.
“Se conseguimos o credenciamento devemos também ao apoio que estamos recebendo do Governo do Estado, que tem permitido a modernização da Santa Casa”, lembra o presidente do hospital, Renato Augusto Platz Guimarães.
A prefeitura também deu sua contribuição. O prefeito Rogério Lorenzetti autorizou a realização de estágios pelos residentes em toda a rede municipal de saúde. O CRE e clínicas e consultórios particulares também abriram suas portas para os residentes.
Uma empresa foi contratada para a realização das provas para admissão à residência médica. Participaram do teste 29 médicos, que disputaram as oito vagas, duas em cada especialidade, que foram disponibilizadas.
Os aprovados procedem do Rio de Janeiro, Medianeira, Curitiba, Maringá, Andirá e três de municípios da região da Amunpar. As estatísticas apontam que 60% dos especialistas se fixam na cidade onde fizeram a sua residência médica.
A especialização tem duração de dois anos, exceto a de oftalmologia, que é de três anos. Os residentes foram recepcionados na última quinta-feira por diretores leigos e técnicos do hospital.
POTENCIAL PARA A RESIDÊNCIA – Vice-coordenador do Conselho de Residência Médica (Coreme) da Santa Casa, o cirurgião Jorge Pelisson diz que sempre acreditou que o hospital tinha condições de prestar este serviço.
“Só que achei que ia demorar um pouco mais. A preocupação era agregar os médicos para viabilizar a residência. Mas tudo isso aconteceu rapidamente”, comemora o médico.
As opiniões dos preceptores são quase que unânimes, com pouquíssimas divergências. Mas em um ponto há unanimidade: a residência médica é um passo concreto, o embrião, para que Paranavaí tenha, em alguns anos, seu curso de medicina.
“Pode parecer estranho para o leigo termos aqui a especialização e não ter a graduação. Mas é assim mesmo. Para a especialização precisamos de instalações, equipamentos e médicos com títulos de especialistas. Já para a graduação é mais complicado: é grade curricular multidisciplinar, disponibilidade de professores e a formação acadêmica é mais complexa”, explica Pelisson, que acrescenta: “estamos no caminho natural para daqui alguns anos Paranavaí ter seu curso de medicina”.
Fávero Neto também diz que naturalmente foi aberto o caminho para o curso de medicina em Paranavaí. “A residência é o upgrade que Paranavaí necessitava na área médica. Ela é uma via de mão dupla, pois enquanto os residentes estão se especializando nós, que estamos passando nosso conhecimento e nossa experiência, nos obrigamos a estudar mais, nos reciclar para poder passar melhor o conhecimento”.
O cirurgião acredita que em quatro anos a população vai sentir a mudança que está se iniciando agora. “Teremos mais especialistas em Paranavaí e região. Teremos mais mão de obra disponível e especializada, pois esta mão de obra vai se fixar na região”.
Daniela Frazzato, que vai atuar junto com outros seis especialistas, lembra que a residência vai exigir mais dos profissionais, “mas o trabalho vai ser dividido entre todos. Haverá um salto na qualidade do atendimento em Paranavaí e o começo de um trabalho para que a cidade tenha seu curso de medicina”.
Mais incisivo, Michel Spigolon, diz que a residência médica vai tirar a categoria “da zona de conforto, o comprometimento dos profissionais e dos laboratórios terá que ser maior, alguns vícios de comportamento terão que ser eliminados”.
Informa ele que o principal público a ser atendido pelos residentes, sempre com a supervisão de um preceptor, serão os pacientes do SUS. “Haverá uma melhora no atendimento desta clientela. Os residentes estarão estagiando e com disciplinas nas enfermarias do SUS. E lá eles encontrarão os casos que serão objeto de discussão médica”.
O intensivista diz que residentes terão que produzir artigos científicos e discutir casos clínicos. “Os questionamentos dos residentes serão permanentes e nós, que já temos o título de especialistas, teremos que estar aptos a dar respostas”, diz, lembrando que no seu caso, por exemplo, já está abrindo uma página de discussão da especialidade numa rede social e seu grupo de trabalho, que envolve UTI, nefrologistas, pneumologistas, cardiologistas, médicos do saúde da família e gastroenterologista já pensa em fazer mestrado. “Temos que sair da zona de conforto – insiste ele. Temos que repensar conceitos, se atualizar. É um marco importante. E o caminho natural para o curso de medicina”.
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TREINAMENTO EM SERVIÇO
– Rubens Costa Monteiro Filho segue a mesma linha de raciocínio. Ele explica que os médicos não têm recompensa pecuniária para participar da residência.
“Mas os preceptores e os demais profissionais envolvidos (cerca de 60% do corpo clínico do hospital), terão, além da satisfação pessoal de formar especialistas, uma valorização profissional extraordinária. Os residentes já são médicos e vamos trabalhar unidos, melhorando a qualificação”, diz ele.
Monteiro Filho acredita que em quatro a seis anos será possível reivindicar, com as condições técnicas apropriadas, o curso de medicina para Paranavaí e a Santa Casa se tornar num hospital-escola. Mas, de imediato, diz ele, o quadro clínico melhora e a qualidade dos médicos avança, “pois o que estamos fazendo é o treinamento em serviço, com o consequente aperfeiçoamento de todos os envolvidos”.

Como funciona a residência médica
A residência médica é uma modalidade de ensino de pós-graduação destinada a médicos sob a forma de curso de especialização.
Em Paranavaí serão inicialmente oito residentes. Neste primeiro ano são chamados de R1. Ano que vem passarão a R2 e serão abertas oito novas vagas para R1. Os residentes do segundo anos ajudarão na especialização dos novatos. Eles recebem uma bolsa auxílio de quase R$ 3 mil por mês. No caso da Santa Casa o Governo Federal vai bancar esta bolsa.
Eles são avaliados (passam por provas) periodicamente para que seus conhecimentos sejam testados. O preceptor pode usar um caso de um paciente para fazer uma prova.
Os residentes assistem consultas e procedimentos sempre com o consentimento do paciente. Eles exercerão atividades em ambulatório de especialidades, enfermarias específicas das especialidades, unidade básica de saúde, enfermaria geral e pronto socorro. Participarão de discussão de artigos científicos, assistirão aulas com temas relacionados às especialidades, com discussão de casos clínicos oriundos da enfermaria do hospital, aulas de bioética, ética médica, metodologia científica, epidemiologia e bioestatística.
O atual corpo clínico da Santa Casa possui pouco mais de 80 médicos. Com os residentes aumenta em 10% o corpo clínico do hospital. E ano que vem serão 16, ampliando ainda mais o número de médicos.
A residência em clínica cirúrgica é pré-requisito para outras residências, como as de cirurgia urológica, vascular, tórax e pediátricas, por exemplo. A especialização em clínica médica é pré-requisito obrigatório para especialidades como nefrologia, UTI, pneumologia e cardiologia, só para citar alguns exemplos.
Na avaliação dos diretores da Santa Casa, o hospital tem condições para oferecer outras duas residências médicas: em Ginecologia e Obstetrícia e anestesiologistas.
Para trabalhar com os residentes os profissionais devem ter títulos expedidos pelas entidades nacionais da especialidade. São geralmente chamadas de Sociedade Brasileira seguida do nome da especialização.
No caso dos especialistas formados pela residência médica da Santa Casa o título de especialistas será conferido pelo próprio Ministério da Educação.
Por transitarem por várias áreas, estes residentes forçam seus instrutores a se atualizarem e há uma queda acentuada no que os médicos chamam de intercorrências, ou seja, um paciente é internado com uma patologia ou um trauma e pode ter outros problemas que não são detectados por falta de um diagnóstico mais apurado.
Nas cidades onde há instituições ofertando residência médica há uma melhora no nível de resolutividade na atenção básica (postos de saúde), já que o médico não quer correr o risco de ser flagrado numa ação chamada no jargão médico de “empurroterapia” por um residente.