Obama diz que avião foi atingido por míssil e critica apoio russo a rebeldes

SÃO PAULO E NOVA YORK – O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, afirmou ontem que o avião da companhia Malaysia Airlines que caiu no dia anterior na Ucrânia, matando 298 pessoas de ao menos 11 nacionalidades, foi atingido por um míssil terra-ar lançado a partir de uma área do leste do país que está sob controle de separatistas apoiados pela Rússia.
É uma conclusão similar à apontada mais cedo pela enviada dos EUA ao Conselho de Segurança da ONU, Samantha Power, e por um relatório vazado à rede de TV americana CNN.
Uma vez mais, o americano acusou o governo russo de prover aos rebeldes vários armamentos, inclusive os mais pesados, e treinamento militar. Além disso, afirmou, o Kremlin continua se recusando a "adotar os passos necessários" para acabar com o conflito e, por isso, é alvo de sanções econômicas internacionais – ampliadas na quarta (16), antes do acidente.
"Não é possível que os separatistas operem como operam e tenham o equipamento que têm, independentemente do que houve com o avião da Malaysia. Um grupo de separatistas não pode derrubar um avião militar e um jato de combate sem treinamento, e isso está vindo da Rússia", afirmou a jornalistas, na Casa Branca.
Nas últimas semanas, foram derrubados, em regiões separatistas da Ucrânia, um cargueiro militar, um helicóptero e um jato de combate.
O presidente classificou o episódio de "tragédia global" e pediu que seja realizada uma "investigação internacional crível", inclusive garantindo a adoção de um cessar-fogo que permita o acesso irrestrito de especialistas internacionais à área do acidente. O mesmo pedido já havia sido feito, mais cedo, pelo presidente russo, Vladimir Putin, e pela chanceler alemã, Angela Merkel.
Obama também confirmou a identificação de um dos 298 mortos como um cidadão americano, Quinn Lucas Schansman.
"É importante para nós reconhecer que o tamanho desse evento destaca que é hora de restabelecer a paz na Ucrânia", disse. Obama elogiou os "esforços do governo ucraniano em adotar um cessar-fogo e um plano de paz" e disse que eles têm sido minados pela ação dos rebeldes, "graças ao apoio russo".
RUSSOS – Perante o Conselho de Segurança da ONU, os EUA reafirmaram que a principal suspeita sobre o tipo de armamento usado na ação recai sobre o míssil Buk tipo SA-11 e frisaram que não está descartado o envolvimento de cidadãos russos em terra.
"Por causa da complexidade técnica do [míssil] SA-11, é improvável que os separatistas possam ter efetivamente operado o sistema sem a ajuda de pessoal especializado", afirmou Power, a representante dos EUA. "Portanto, não podemos descartar a assistência de pessoal russo para operar os sistemas".
Para Power, se separatistas apoiados pela Rússia estiverem por trás do ataque, "eles e seus apoiadores têm uma boa razão para esconder as evidências de seu crime".
Presente à sessão, o embaixador russo na ONU, Vitaly Churkin, disse ser necessário investigar a responsabilidade das autoridades ucranianas na queda do avião.
"Para qualquer pessoa normal, uma pergunta aparece: por que [controladores] ucranianos enviaram um voo de passageiros a uma área de conflito militar – uma área que está sendo usada para atacar alvos civis?", questionou.

Insurgentes comentam derrubada de avião civil em grampo

O serviço de inteligência da Ucrânia afirmou ontem ter interceptado conversas entre separatistas pró-Rússia no país nas quais os envolvidos – na maioria não identificados – comentam uma ação na qual um avião foi derrubado. Nas conversas, um deles questiona se havia armas a bordo, e o interlocutor responde que há apenas "objetos civis".
Os diálogos levantaram questões sobre os motivos pelos quais um avião comercial sobrevoava uma zona de guerra na qual outras aeronaves – todas militares – já tinham sido derrubadas, nas últimas semanas.
A autenticidade das gravações não pôde ser confirmada por uma fonte independente.

Leia abaixo a transcrição do diálogo, traduzida ao português a partir da versão em inglês:
Primeira gravação
[Voz masculina, identificada como a do líder separatista Igor Bezler]: O grupo de Miner [pseudônimo] acaba de abater um avião, que caiu logo atrás de Yenakiyevo.
[Cel. Geranin]: Pilotos. Onde estão os pilotos?
[Bezler]: Saíram em busca para fotografar o avião. Está soltando fumaça.
[Segunda voz masculina, identificada como coronel Vasily Geranin, da inteligência militar russa]: Quantos minutos atrás?
[Bezler]: Cerca de 30 minutos atrás.
Segunda gravação
[Voz masculina, identificada como "Grego", na legenda]: Sim, major.
[Major]: Bem, os meninos de Chernukhino derrubaram o avião.
[Grego]: Quem derrubou?
[Major]: O pessoal do bloqueio de esteada em Chernukhino. Os cossacos de Chernukhino.
[Grego]: Sim, major.
[Major]: Bem, o avião se desfez no ar, perto da mina de carvão de Pertropavlovskaya. A primeira vítima 200 [jargão militar para cadáver] foi encontrada. Um civil.
[Grego]: Bem, o que nós temos lá?
[Major]: Basicamente um avião 100% civil.
[Grego]: Muita gente por lá?
[Major] [Palavrão.] Os destroços caíram bem no quintal.
[Grego]: Que tipo de avião?
[Major]: Ainda não descobri porque não cheguei aos destroços principais. Estou olhando o lugar no qual os primeiros corpos começaram a cair. Há restos de apoios internos, assentos e corpos, aqui.
[Grego]: Entendo. Armas de algum tipo?
[Major]: Nada. Coisas civis, coisas de primeiros socorros, toalhas, papel higiênico.
[Grego]: Algum documento?
[Major]: Sim. De um estudante indonésio. Da Universidade Thompson. [Palavrão.]
Terceira gravação
[Voz masculina, identificada como a de um combatente]: Quanto ao avião abatido na área de Snezhnoye-Torez. É civil. Caiu perto de Grabovo. Há muitos corpos de mulheres e crianças. Os cossacos estão por lá vendo tudo isso.
Dizem na TV que é um avião de transporte ucraniano An-26, mas o pessoal está dizendo que no avião está escrito Malaysia Airlines. O que ele estava fazendo em território ucraniano?
[Voz masculina, identificada como a do comandante cossaco Nikolai Kozitsyn]: Isso quer dizer que eles estavam carregando espiões. Não deveriam estar voando, [palavrão]. Há uma guerra em curso.