Papa diz que pacificação não funciona se sociedade abandona periferia
"Nenhum esforço de ‘pacificação’ será duradouro, não haverá harmonia e felicidade para uma sociedade que ignora, que deixa à margem, que abandona na periferia parte de si mesma. Uma sociedade assim simplesmente empobrece a si mesma; antes, perde algo de essencial para si mesma", discursou Francisco.
"A medida da grandeza de uma sociedade é dada pelo modo como esta trata os mais necessitados, quem não tem outra coisa senão a sua pobreza!", completou.
O uso da palavra "pacificação" é uma referência às UPPs (Unidade de Polícia Pacificadora), projeto do governo do Rio para diminuir a violência.
Dirigindo-se aos ricos, dirigentes e "a todas as pessoas de boa vontade comprometidas com a justiça social", Francisco fez um apelo: "Não se cansem de trabalhar por um mundo mais justo e mais solidário! Ninguém pode permanecer insensível às desigualdades que ainda existem no mundo! Cada um, na medida das próprias possibilidades e responsabilidades, saiba dar a sua contribuição para acabar com tantas injustiças sociais!"
"Não é a cultura do egoísmo, do individualismo, que frequentemente regula a nossa sociedade, aquela que constrói e conduz a um mundo mais habitável, mas sim a cultura da solidariedade; ver no outro não um concorrente ou um número, mas um irmão".
Duro com os ricos e as classes dirigentes, Francisco elogiou a disposição de "colocar mais água no feijão" dos moradores de Varginha.
"Vocês sempre dão um jeito de compartilhar a comida: como diz o ditado, sempre se pode "colocar mais água no feijão"! E vocês fazem isto com amor, mostrando que a verdadeira riqueza não está nas coisas, mas no coração!"
Para o pontífice, os "pilares fundamentais" e "bens imateriais" de um país são: "vida, família, educação integral, saúde e segurança".
"A vida, que é dom de Deus, um valor que deve ser sempre tutelado e promovido; a família, fundamento da convivência e remédio contra a desagregação social; a educação integral, que não se reduz a uma simples transmissão de informações com o fim de gerar lucro; a saúde, que deve buscar o bem-estar integral da pessoa, incluindo a dimensão espiritual, que é essencial para o equilíbrio humano e uma convivência saudável; a segurança, na convicção de que a violência só pode ser vencida a partir da mudança do coração humano".
No final, um aceno aos jovens para que não desistam de lutar contra a corrupção: "Vocês, queridos jovens, possuem uma sensibilidade especial frente às injustiças, mas muitas vezes se desiludem com notícias que falam de corrupção, com pessoas que, em vez de buscar o bem comum, procuram o seu próprio benefício. Também para vocês e para todas as pessoas repito: nunca desanimem, não percam a confiança, não deixem que se apague a esperança. A realidade pode mudar, o homem pode mudar. Procurem ser vocês os primeiros a praticar o bem, a não se acostumarem ao mal, mas a vencê-lo".
"O Rio está sob controle, está em paz", diz governador
O governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), disse ontem que não perdeu o controle da situação após os confrontos entre manifestantes e policiais nos últimos dias. "O Rio de Janeiro está sob controle, está em paz", afirmou aos jornalistas, depois da visita do papa Francisco ao Palácio da Cidade.
O governador disse que a corregedoria da Polícia Militar está apurando o episódio da prisão do estudante Bruno Ferreira Teles, 27, apontado inicialmente como autor do disparo de um coquetel molotov, mas que, segundo o inquérito, não portava o artefato.
"Pode haver falhas. Isso está sendo apurado pela corregedoria. Ninguém passa a mão na cabeça de qualquer lado. Se ele (estudante) jogou o coquetel, se estava ou não estava, e foi apreendido assim, tudo isso é motivo de averiguação. Não podemos punir inocente", disse.
"Por outro lado, a imprensa registrou um policial sendo incendiado por coquetel. Isso tudo são fatos concretos", ressaltou. "Não aceitamos nenhum tipo de má conduta de policial militar ou civil, como também não admitimos que uma pessoa vá para algum lugar com coquetel molotov", disse.
Bruno Teles foi preso em flagrante na segunda-feira durante protesto contra em frente ao Palácio Guanabara. Ele não carregava coquetéis molotov no momento da detenção, segundo depoimento prestado pelo policial militar que o deteve. A informação foi publicada numa reportagem veiculada anteontem no "Jornal Nacional".
O depoimento do policial contraria informações divulgadas pelas polícias Civil e Militar a respeito da prisão de Teles. Em notas divulgadas logo após a prisão, as corporações informavam que ele tinha sido preso por portar artefatos explosivos.