Plano de 1947 incluía construção de ferrovia até Porto São José

O debate que vem sendo feito nos últimos meses, sobre a construção das linhas de trem ligando o Mato Grosso do Sul ao Rio Grande do Sul e ao Porto de Paranaguá é coisa antiga. As recentes propostas são para estender as linhas de Maracaju-MS ao Porto de Rio Grande-RS, passando pelas cidades paranaenses de Guaíra, Cascavel, Pato Branco, Guarapuava, Rio Negro e chegando a Paranaguá, com entroncamento para o Sul – Mafra em Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Outra proposta admitida pelo Governo Federal visa estender a linha desde Panorama-SP, passando por Maringá, Campo Mourão, Cascavel, Pato Branco, seguindo a mesma rota da proposta anterior, a partir daí. Ambas as propostas, porém, continuam isolando a região Noroeste do Paraná, pois o roteiro não contemplaria nenhum município da Microrregião de Paranavaí. E isto vem motivando setores da sociedade da região e a própria Amunpar (Associação dos Municípios do Noroeste do Paraná), sob Presidência de Paulo Peroba, prefeito de São Carlos do Ivaí, a intervir junto às autoridades estaduais e federais na reivindicação.
Embora não esteja incluída nos recentes traçados, que claramente procuram atender interesses de cidades e grupos políticos e econômicos mais poderosos, com maior influência política e econômica, a região de Paranavaí já fez parte de planos ferroviários, na época do auge da produção de café e algodão. Na década de 1950 e 1960, a Rede Ferroviária Federal chegou a construir grandes barracões em Paranavaí (atualmente alugados à Yoki Alimentos para estocagem de farinha e fécula de mandioca) na Rua Tupi, na Coloninha do Jardim São Jorge, para esperar o trem. É que, então, havia a perspectiva da extensão da rede ferroviária, que havia chegado a Maringá em 1954, até Paranavaí, para pegar as produções agrícolas que demandavam ao Porto de Paranaguá. Os barracões foram construídos, mas o trem não veio, “porque o governo não tinha dinheiro para construir as linhas”, disse Edmar Rotondo, que veio para Paranavaí em 1961 para gerenciar o armazém construído em 1959 pela Armazéns Gerais da Rede Ferroviária Federal (AGEF). Na mesma entrevista publicada pelo Diário do Noroeste em 14 de dezembro de 2012, outro antigo funcionários da Rede, Mário Schiavo, lamentava a não conclusão da proposta e a Rede foi desativada em 1982.
A proposta para construção da linha férrea até Paranavaí era de muito antes da construção do armazém. Na verdade, a proposta era levar o trem até o Porto São José, município de Porto Rico, fazendo parte dos planos do Governo Federal de Getúlio Vargas e do Governo Estadual de Manoel Ribas para povoar e promover a  ocupação do Oeste do Brasil, para proteger as fronteiras das invasões estrangeiras, especialmente do Paraguai. Do Porto São José as linhas se aglutinariam com as procedentes do Mato Grosso (do Sul atual).
A alimentação da ideia aconteceu, porém, apenas em 1947, no primeiro mandato de governador de Moysés Willie Lupion de Troya (Jaguariaíva, 25 de março de 1908 — Rio de Janeiro, 29 de agosto de 1991). Na mensagem apresentada à Assembleia Legislativa do Estado, por ocasião da abertura da Sessão Legislativa, em 1º de maio de 1948 (disponível no Arquivo Público do Paraná, páginas 47 a 57 de um total de 158 páginas)  Lupion (que governou o Paraná de 1947 a 1951 e de 1956 a 1961) já exaltava que um dos principais empreendimentos no tocante à política de transportes, era a ligação ferroviária do norte, a partir da cidade de Apucarana, onde os trilhos já haviam chegado por obra dos ingleses da Companhia de Terras do Norte do Paraná, em 1942.
Aberta ao tráfego em 1925, ligando Ourinhos, na linha-tronco da E. F. Sorocabana, em São Paulo, a Cambará, no Paraná, a Estrada de Ferro Noroeste do Paraná foi comprada pelos ingleses da Companhia de Terras do Norte do Paraná, teve seu nome alterado para Estrada de Ferro São Paulo-Paraná. Prolongada até Apucarana em 1942 e povoando a região, virgem até 1929, foi vendida ao Governo Federal em 1944 e incorporada imediatamente à Rede Viação Paraná-Santa Catarina. Foi prolongada, em diversas fases, até atingir Maringá em 1954 e desviada de Paranavaí para Cianorte, em 1972, por interesse da Companhia Melhoramentos do Norte do Paraná (sucessora da Companhia de Terras do Norte do Paraná, em 1951) onde parou. O objetivo era chegar a Guaíra. Em toda a sua extensão era área de colonização da CTNP (depois CMNP).
Em sua mensagem, Lupion destaca que "devemos dar um especial destaque neste plano de viação ao Decreto-Lei nº 663, de 1947, que autoriza a Secretaria de Viação e Obras Publicas a fixar condições técnicas, a iniciar estudos e organizar o projeto e orçamento de uma estrada de ferro que, partindo de Apucarana, onde entronca na linha tronco que se dirige para Ourinhos, atinja, entre Ponta Grossa e Palmeira, o ponto mais conveniente na Rede de Viação Paraná-Santa Catarina. Essa ferrovia, a que demos a denominação de Estrada de Ferro Central do Paraná, deverá ser, no futuro, depois de concluída a ligação prevista, prolongada de Apucarana, rumo NO (Paraná-Mato Grosso), até atingir o porto São José, no rio Paraná, na divisa com o Estado de Mato Grosso, e no Sul, rumo SE, até atingir um dos nossos portos marítimos como ponto de escoamento".
Dizia ainda o relatório de Lupion: “Pela Lei 48 de 18/02/1948 já foi o Governo autorizado pela Assembleia Legislativa a concluir a operação de crédito necessária a essa obra vital e de extraordinária transcendência para o futuro grandioso da nossa terra”.
“Qualquer que ande medianamente a par de nossos problemas, sabe que a tal ferrovia é a providência mais fundamental em um plano de grande alcance que vise os interesses econômicos do Paraná.
É nosso pensamento que essa obra, de tão alta significação para o nosso estado, esteja em vias de conclusão ao finalizarmos o nosso governo, e para isso estamos tomando todas as providências que se fazem de mister.
Em articulação com a ligação de Apucarana e com a melhoria substancial da ligação ferroviária de Curitiba a Paranaguá, constituindo tudo um conjunto orgânico de medidas cujo sentido é bem evidente, vieram os empreendimentos ligados ao reaparelhamento do Porto de Paranaguá”.
E como justificativa para esse empreendimento, "o Governo considerou Apucarana como ponto obrigatório de passagem de uma linha férrea que deverá ser constituída na faixa situada entre os rios Pirapó e Ivaí, para atingir o Porto São José, na divisa de Mato Grosso, e que, como as demais terras da região, é das mais férteis e mesmo qualquer outro que, como o atual, procure o rio Paraná, em Porto Guaíra. E se ele, no futuro, levar as linhas dessa estrada diretamente ao Porto de Paranaguá, não haverá no país uma estrada que se lhe iguale em possibilidades financeiras e de tão grande alcance econômico, principalmente para o Estado que terá o controle geral sobre a exportação de seus produtos".
Porem, apesar do destaque todo especial à construção dessa estrada, foi verificado pela mensagem do sucessor Governo Ney Braga, no ano de 1963, que a ligação entre Ponta Grossa e Apucarana ainda estava sendo executada, havendo por outro lado no Paraná 1.932 km em tráfego, sendo 1.872 km administrados pela Rede de Viação Paraná-Santa Catarina.
Em 1967, o trecho entre Apucarana e Ponta Grossa estava concluído, não ultrapassando a cidade de Araruna. Também na mensagem do ano de 1968, o Governo do Estado faz referências sobre a ferrovia, sem que soluções tivessem sido apresentadas. Ou seja, desde 1948 o Governo do Paraná vem se preocupando com a
construção do trecho ferroviário entre os planaltos de Curitiba e Ponta Grossa e as regiões noroeste do Estado; logrou inclusive ser incorporado ao Plano Nacional de Viação, face às características prioritárias de que era revestido. Não evoluíram os trabalhos em razão da reconhecida crise a que foram lançadas as ferrovias brasileiras. A partir daquela época, já o Estado do Paranã vinha experimentando profundas
transformações econômicas que o levaram a se constituir no maior centro produtor primário do pais, o que viria consequentemente exigir vias de transportes que pudessem suportar o escoamento da crescente produção oriunda do norte paranaense. O governo, então, deu ênfase às rodovias, mais baratas que as ferrovias.
No decênio de 1960, sob a responsabilidade do DNER (Departamento de Estradas
de Rodagens do Paraná) , com financiamento do Governo Estadual e Federal e da CODEPAR (Companhia de Desenvolvimento do Paraná), foi colocada em prática a construção da Rodovia do Café – BR-104 (depois renumerada como BR-376). Como meta principal do programa estabelecido no Plano Quinquenal de 1961, a Rodovia do Café "fará a ligação do Porto de Paranaguá a Curitiba e, seguindo para o Norte do Estado, passará por Ponta Grossa, Ortigueira, Araruna, Califórnia, Apucarana, Cambira, Jandaia do Sul, Mandaguari, Marialva, Maringá, Nova Esperança e Paranavaí, totalizando 572 quilômetros de percurso". E, em etapa posterior, objetivando atingir o Estado do Mato Grosso, "atingirá Porto São José, nas barrancas do Rio Paraná", conclui o documento.
Por sua abrangência, esta rodovia pode ser considerada uma das principais artérias, ou mesmo um dos principais troncos rodoviários do território paranaense, possibilitando, de um lado, economia no custo do transporte, maior facilidade no escoamento dos produtos agrícolas e, por outro lado, veio amenizar o isolamento físico entre a população de um município e outro.