Proposta que regulamenta terceirização pode ser votada na quarta pelos deputados
BRASÍLIA – A proposta que regulamenta a terceirização no Brasil está na pauta de votação da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, da Câmara dos Deputados, para quarta-feira (10).
Se aprovado, o substitutivo do deputado Arthur Oliveira Maia (PDMB-BA) ao Projeto de Lei PL 4330/04, do deputado Sandro Mabel (PMDB-GO), pode ir direto ao Senado, sem passar pelo Plenário.
Sindicalistas, empresários, deputados e representantes do Executivo reuniram-se na última quarta-feira para tentar chegar a um consenso sobre o texto, atualmente regulado pela Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST). O texto do tribunal prevê a terceirização apenas em atividades-meio das empresas e com responsabilidade subsidiária.
Foi escolhido um grupo composto de três deputados, três representantes do governo federal, três das centrais sindicais e três do setor empresarial para se reunir nesta segunda (8) e terça-feira (9) e definir as novas regras da terceirização.
O Ministério do Trabalho não tem números oficiais de terceirizados no País. Segundo estudo de 2012 do Sindicato das Empresas de Prestação de Serviços a Terceiros (Sindeprestem), de São Paulo, eles podem chegar a 10,5 milhões de pessoas.
Esse número representa 31% dos 33,9 milhões de trabalhadores com carteira, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) feita em 2011 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
DIVERGÊNCIAS – De acordo com o secretário de Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho, Manoel Messias, há quatro pontos principais de divergência entre empregados e empregadores.
O primeiro é se a terceirização deve valer para todas as atividades da empresa ou se só para trabalhos secundários, as chamadas atividade-meio.
O segundo ponto é definir se a responsabilidade da empresa contratante em relação às obrigações trabalhistas deve ser solidária ou subsidiária.
O terceiro ponto é relacionado à garantia dos direitos trabalhistas aos terceirizados, em especial a como deve ficar a representação sindical.
O último ponto é sobre a terceirização no serviço público.
Abrangência da terceirização
Em seu relatório, o deputado Arthur Oliveira Maia (PMDB-BA) defendeu o fim do uso das expressões atividade-meio e atividade-fim para diferenciar o que pode ser objeto de terceirização.
Segundo ele, a discussão deve estar no fato de a empresa terceirizada ser ou não especializada. O objetivo é evitar que a empresa funcione apenas como intermediadora de mão de obra, como um “guarda-chuva” para diversas funções.
“Não admitirei que retorne ao texto esse conceito de atividade-meio e atividade-fim. Não conheço nada mais impreciso”, disse Maia. O deputado aceitou uma alteração no texto para deixar claro que as intermediações previstas na legislação, como o trabalho temporário (previsto na Lei 6.019/74), não entram na proibição.
Na prática, a proposta permite que qualquer atividade de uma empresa possa ser terceirizada, desde que a contratada esteja focada em uma atividade específica. Maia cita a montagem de automóveis, com várias empresas terceirizadas responsáveis pelos diversos componentes do carro, como uma forma de terceirização especializada.
Para o 1º secretário da Força Sindical, Sérgio Leite, o conceito ainda é muito polêmico no meio sindical. “A nossa posição, até que se prove ao contrário, é delimitar o que pode ser terceirizado ou não”, disse. Ele é um dos representantes sindicais do grupo de discussão proposto pelo governo. As centrais sindicais anunciaram para a próxima quinta-feira (11) manifestações em todo o País, e a terceirização é um dos principais temas.
Na opinião da gerente-executiva de Relações do Trabalho da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Sylvia Lorena, a proposta traz segurança jurídica para o setor e protege o trabalhador. Ela também está na mesa de negociações da terceirização.
As empresas que atuam como correspondentes bancários ou postais não precisam ser especializadas, de acordo com a proposta. Essas empresas atuam normalmente em pequenos municípios prestando serviços de agências de bancos ou dos correios, como as lotéricas ao aceitar receber contas. Bancários de todo o País fecharam agências nesta quinta-feira (4) em protesto contra a proposta.
A terceirização não vale, segundo a proposta, para contrato de trabalhadores domésticos. Quem deixar de cumprir as regras de terceirização deverá pagar multa no valor do piso da categoria por cada trabalhador prejudicado.
Responsabilidade subsidiária x solidária
De acordo com o substitutivo de Arthur Maia, a empresa contratante terá responsabilidade subsidiária relativa em relação às obrigações trabalhistas e previdenciárias. Ou seja, quem contrata passa a ser responsável por direitos como o pagamento de férias ou de licença-maternidade, se forem esgotados os bens da firma terceirizada.
Isso vale como regra se a empresa contratante comprovar que fiscalizou o recolhimento dos direitos trabalhistas pela empresa terceirizada. Se a empresa contratante for omissa e não fiscalizou, vale a responsabilidade solidária, que ocorre quando o trabalhador pode cobrar o pagamento de direitos trabalhistas tanto da empresa terceirizada quanto da contratante.
A contratante terá de fiscalizar mensalmente o pagamento de salários, horas-extras, décimo terceiro salário, férias, entre outros direitos. Quando houver alguma irregularidade, a empresa deverá reter o pagamento da fatura mensal proporcional às obrigações trabalhistas não pagas e notificar a contratada, em dez dias, das razões da medida. O dinheiro ficará, segundo a proposta, em uma conta específica da contratante para isso.
A empresa contratante também será responsabilizada subsidiariamente, mas não solidariamente, pelas condições de segurança, higiene e salubridade para os terceirizados. Pela proposta, qualquer acidente com um trabalhador terceirizado deverá ser comunicado à contratada.
A regra ainda é vista com ressalvas pelos sindicalistas. “As centrais defendem a solidariedade”, disse Leite. O secretário Manoel Messias disse que a responsabilidade subsidiária é contrária a uma posição histórica do Ministério, por acreditar que a medida piora as relações de trabalho. Ele reconheceu que o modelo intermediário é um avanço à súmula 331, mas não está de acordo com a vontade dos trabalhadores.
Para a gerente-executiva de Relações do Trabalho da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Sylvia Lorena, a proposta garante ao trabalhador uma “dupla proteção” com a responsabilidade subsidiária relativa. Ela concorda que a mudança avança em relação ao estabelecido pela Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho
REPRESENTAÇÃO SINDICAL – A filiação sindical dos trabalhadores terceirizados é, para o relator do Projeto de Lei 4330/04 na Comissão de Constituição e Justiça, deputado Arthur Oliveira Maia (PMDB-BA), a principal dificuldade das negociações.
A proposta prevê que os empregados terceirizados sejam regidos pelas convenções ou acordos trabalhistas feitos entre a contratada e o sindicato dos terceirizados. As negociações da contratante com seus empregados não se aplicariam aos terceirizados.
“O ponto mais difícil do projeto é quando alguns desejam que a terceirizada esteja vinculada à atividade da contratante. Encontrei uma terceirizada que digitalizava os processos do TST. Se eles tiverem de se filiar, será ao sindicato dos servidores do tribunal? É difícil”, reclamou o relator.
Na opinião do 1º secretário da Força Sindical, Sérgio Leite, essa medida é o “câncer” da negociação coletiva. Ele reivindica que os terceirizados tenham os mesmos direitos, a mesma negociação coletiva da atividade preponderante da empresa contratante. “Justamente para não precarizar as relações de trabalho, para não ter um trabalhador com menos direitos que outro”, disse.
O secretário de Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho, Manoel Messias, concorda com os sindicalistas sobre a forma de regulamentar a sindicalização dos terceirizados.
“A regra que achamos mais saudável é a da categoria preponderante. Só não estariam submetidos à convenção da categoria preponderante aqueles com atividade completamente diferente”, afirmou. Seria o caso, por exemplo, de um trabalhador terceirizado de limpeza em uma consultoria de análise financeira.
Já para a gerente-executiva de Relações do Trabalho da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Sylvia Lorena, a relação sindical deve ser entre o trabalhador terceirizado e a empresa terceirizada. “Ele pode trabalhar em mais de uma empresa como terceirizado, pode receber direitos trabalhistas de outras empresas”, afirmou.
De acordo com o ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Ives Gandra Martins Filho, a terceirização pode gerar um esfacelamento do poder sindical. “Quando você esfacela em muitas empresas e muitos segmentos diferentes, a força de união dos trabalhadores é menor, e o sindicato tem menos poder de barganha”, disse.
Terceirização no serviço público
Pela proposta, a Administração Pública poderá contratar terceirizados, desde que não seja para executar atividades exclusivas de Estado, como regulamentação e fiscalização.
Sempre que o órgão público atrasar sem justificativa o pagamento da terceirizada será responsável solidariamente pelas obrigações trabalhistas da contratada. Além disso, os gestores do contrato serão enquadrados por improbidade administrativa, punível com demissão, de acordo com a Lei 8.429/92.
Os contratos serão revisados sempre que houver acordo para reajuste dos salários dos empregados terceirizados.
RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA – Atualmente, a súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST) prevê a responsabilidade subsidiária da administração pública, que só pode contratar terceirizados para atividades-meio.
Desde março de 2012, o tribunal suspendeu a análise de processos trabalhistas no serviço público. O motivo é que o Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu, em 2010, que a Lei de Licitações (8.666/93) não permite que a Administração Pública seja responsabilizada pelo não-pagamento de obrigações trabalhistas pela terceirizada.
A decisão ainda não é final: está em análise um recurso no Supremo de um processo trabalhista que deve ter repercussão geral sobre a questão, pela ministra Rosa Weber.
Segundo o ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Ives Gandra Martins Filho, o tribunal começou a se adaptar às definições do Supremo. “Não é possível uma responsabilidade objetiva da administração. É possível uma responsabilidade subjetiva, desde que demonstrada a culpa”, afirmou.
Pela proposta, a Lei de Licitações é alterada para permitir a responsabilização subsidiária relativa no serviço público. “Se não for alterada, a Administração Pública não terá nenhum tipo de responsabilidade em relação às obrigações trabalhistas nos contratos de terceirização que celebra”, disse o relator.
O texto também proíbe a contratação de empresa terceirizada por pregão eletrônico se o valor destinado à mão de obra ficar acima de 50% do valor total do contrato de prestação de serviços.
Para o secretário de Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho, Manoel Messias, a discussão sobre serviço público deveria vir em outra proposta. “Vamos ver se é mais adequado entrar agora ou se podemos apresentar linhas gerais e ter um outro regulamento que detalha essa terceirização”, afirmou. Essa posição, de adiar a discussão sobre a terceirização no serviço público, também é defendida pelas centrais sindicais