“QUEM DE ENTRE VÓS ESTIVER SEM PECADO ATIRE A PRIMEIRA PEDRA” JO 8,7

O cenário nos coloca frente a uma mulher apanhada em adultério. De acordo com Lv 20,10 e Dt 22,22-24, a mulher devia ser morta. A Lei dizia, no entanto, que também o homem que com ela adulterou devia morrer. A Lei deve ser aplicada? É este problema que é apresentado a Jesus.
Os doutores da Lei e os fariseus apresentam questões para testar a fidelidade de Jesus à Lei. Tentam de todos os jeitos armar ciladas para pegarem Jesus e terem motivo de acusação contra ele. (Mc 10,2; 12,13-14).
Diante das apresentações legais do Templo, armados pelos fariseus e doutores da Lei, não se apresentava uma libertação para o pecador, mas já a condenação à morte. Para Jesus trata-se de revelar a atitude de Deus frente ao pecado e ao pecador. “Não quero a morte do pecador, diz o Senhor, mas que ele volte se converta e tenha vida”. (Ez 33,11)
Diante do pecado, Jesus não procura desculpar o pecado da mulher. Ele sabe que o pecado não é um caminho aceitável, pois gera infelicidade e rouba a paz.
No entanto, também não aceita pactuar com uma Lei que, em nome de Deus, gera a morte. Porque os esquemas de Deus são diferentes dos esquemas da Lei. Jesus fica em silêncio, como ficou no julgamento de Pilatos, como a chamar os que participam da cena a refletirem por um momento aquilo que estava em causa.
Aqui lembramos o texto de Daniel 13, a história de Susana. As personagens praticamente se identificam: os juízes que, não conseguindo possuir Susana, a condenam, fazem pensar nos acusadores da adúltera; o jovem Daniel remete a Jesus. Há, contudo uma diferença, que Susana não pecou.
Jesus faz os acusadores perceberem que o pecado é uma consequência dos nossos limites e fragilidades e que Deus nos ama e entende isso.
Isso se aplica a eles e também a nós quando nos colocamos como juízes dos pecadores (damos até a pena) “Quem de vós estiver sem pecado, atire a primeira pedra”. (Jo 8,7)
O evangelho apresenta até uma certa ironia quando diz: “Eles, porém, quando ouviram tais palavras, foram saindo um após outro a começar pelos mais velhos”. Hoje a gente diria: “Quem tem telhado de vidro não joga pedra no telhado dos outros”.
A lógica de Deus não é a lógica de morte, mas uma lógica de vida; a proposta que Deus faz aos homens através de Jesus não passa pela eliminação dos que erram, mas por um convite à vida nova, à conversão, à transformação, à libertação de tudo o que oprime e escraviza; e destruir ou matar em nome de Deus ou em nome de qualquer moral é uma ofensa inqualificável a esse Deus da vida e do amor, que apenas quer a realização plena do homem.
Este episódio nos mostra também, a intransigência e a hipocrisia do homem, sempre disposto a julgar e a condenar… os outros. Jesus denuncia aqui, a lógica daqueles que se sentem perfeitos e auto-suficientes, sem reconhecerem que estamos todos a caminho e que, enquanto caminhamos, somos imperfeitos e limitados. A todos nós Deus diz: “Nem eu te condeno. Vai. E de agora em diante não peques mais”. (Jo 8,11)
A lógica de Deus é a da misericórdia, não a da Lei. Neste caminho quaresmal, há duas coisas a considerar: Deus desafia-nos à superação de todas as realidades que nos escravizam e sublinha esse desafio com seu amor e sua misericórdia; e convida-nos a despir as roupagens da hipocrisia e da intolerância, para vestir as do amor.

Frei Filomeno dos Santos O. Carm